sábado, 6 de outubro de 2012

Horses




Cavalos de Craine
leveza em ondas
crinas deslizando sobre a areia
desenhando a loucura dos pincéis.

Oníricos cavalos de Netuno
alvos móveis
tropel uníssono sob as ondas
na distância secular
na noite eterna.


Oz

Mosaico




Nós, os filhos da máquina, vos saudamos!
hóspedes não convidados..

Meu coração, deserto sem tuaregues
Meu olhar, uma seta para nenhures.

Quem gostaria de ser beijado?
beijado por aquela que, sorrateiramente, nos segue pelas vielas da vida??

A hora se aproxima
os bárbaros estão à porta.

Dez mil escravas loucas não me bastariam
neste tempo enlouquecido de luxúria...

Ouçam, os bárbaros estão no jardim!!!

(...)

Não posso amar, não conheço o amor
Oh, princesa, minha heroína
quem daria conta de um coração tão vagabundo!?

Dois corpos dentro da noite
dentro da noite dois sonhos
intactos.

Duas mentes dentro da noite
dentro da noite o silêncio
o pacto.

A sobrevivência está ameaçada
Oh, príncipes
não nos afastemos
vamos de mãos dadas..

Vamos acender nosso toco de vela
pois faz escuro
temos de iluminar o mundo
e fazer brilhar os olhos daqueles que virão.

Talvez ainda encontremos a saída
A sobrevivência é uma ordem!

Oz
Junho de 2004


                     

segunda-feira, 1 de outubro de 2012

Irmão pequeno




Irmão pequeno
se imaginassem o universo que habita em nós
o tom do silêncio que despe a nossa voz.

Pequeno camaleão sobrevivente
num mundo em preto e branco e sem janelas
que nosso cotidiano seja uma aquarela
com as dores e as alegrias dessa gente.

Ah, irmão pequeno, estamos quase a sós
e não há quem possa ouvir a nossa voz.

Irmão pequeno camaleão
vem, sorri, canta, espera, sente
o sol que aquece a pele e doura o coração.

Irmão pequeno, não vês que é tempo?
tempo de adentrar o continente?

Irmão pequeno dos planaltos áridos
de riso pálido e destino incerto
sombra dançante e olhar deserto
irmão pequeno irmão de abraços cálidos.

Um dia nos encontraremos na encruzilhada
onde estaremos mudos
mais nada.




(...)

Como te aguardamos, meu jovem amigo, no porto com tochas e oferendas, mas a noite, amiga & traiçoeira, urdira outros caminhos para os teus passos, outros quadros para os teus olhos e um cortante pranto para tantos corações em júbilo.

O teu corpo agora jaz na terra fria mas sabemos que o teu espírito permanece nas alturas do universo do ser. Nos perguntamos quais desígnios fizeram surgir tanta desolação onde antes havia antes tanta alegria e luz...

Por onde andavas agora restam o retumbar dos teus passos tranquilos, a lembrança do teu riso contagiante e o exemplo do teu viver intenso e santo...

Oz
Outubro de 2012

sábado, 15 de setembro de 2012

Lobos & homens




Um lobo nos habita
nos caça a mim e a ti cotidianamente
nesta selva instigante e hostil
febril e insana.

A nossa mente aflita
uivos, pesadelos, medos, desencantos
há um lobo faminto em cada canto.

Há uma alcatéia em nós e não sabemos.

Nosso coração covil é uma trincheira íngreme
estamos sós na própria busca
lupinamente e humanamente improvável.
Agasalhados de febre medo e dor.

Predadores e presas na mesma armadilha
sob a mesma pele, sob o mesmo manto
partes inconciliáveis da mesma matilha.

Há uma alcatéia em nós e a ocultamos.


Oz
Julho de 2012

segunda-feira, 6 de agosto de 2012

comentários a respeito de Charlie Wild



          Quando ele desceu da colina envolto em seu manto purpúreo as portas da cidadela estavam escancaradas, havia festa e vinho e nozes e o conselho de ançiãos se reunia na tenda sagrada.
          No longo caminho percorrido Charlie ouviu o canto dos pássaros noturnos, viu o vôo rasante da águia no horizonte, nadou no lago repleto de peixes dourados e azuis.
          Ouviu em tabernas nodosas estórias de crimes e paixões e fugas. Aprendeu a ler as cartas do amor e da morte, deitou-se com mulheres de rima fácil...
          Os frutos do verão trouxeram-lhe alento em tardes moribundas.
         
                           &                             

          O tempo de Charlie Wild

         
          Estando tão somente
          atrás de um grande amor
          o Charlie às vezes sente
          que so lhe resta a dor

          a dor de estar atrás
          de algo impossível
          o mundo lhe desfez
          um todo indivisível.

          Oh, Charlie a tua sina
          é tão triste, cruel...
          cadê tua menina
          passou teu carrosel

          Agora estás ao léu...

          Mas não te abales, Charlie
          teu tempo há de chegar
          então te serás dado
          sorrir, viver, amar...


                                                             

          Na sua chegada Charlie Wild desvendou-lhes o mistério da fonte; estupefatos, ouviram e não creram e não quiseram acreditar no que lhes era revelado e Charlie Wild foi escorraçado, abandonado, banido. Tal mistério jamais poderia ter sido desvendado; não àqueles daquela època.

         Agora as portas da cidadela estavam fechadas e junto aos muros acinzentados mulheres e cães disputavam as carcaças de animais mortos, putrefatos.

          Onde antes um campo de trigo agora um deserto onde lagartos e cactus reproduzem-se ininterruptamente numa noite infinda...

         Oz
         Julho de 2012    


sábado, 4 de agosto de 2012

Por enquanto

                                                   1

          Temporariamente adormecida está a minha esperança, mas sei que em algum lugar alguém está neste momento preparando o terreno para um novo plantio e após a chuva redentora a semente germinará e então haverá uma nova colheita.

          Temporariamene inertes estão os meus passos. Permaneço inerte sob um céu de chumbo. Meus olhos divisam ao longe uma caravana e esta passa ao largo, eu emudecido.

          Um canto desarmônico fere-me os ouvidos.
          Tempo de pregações corruptas, do verbo encurralado em laços profanos... 



           
                                                       2                                                                                                                      



            Confissões de Charlie Wild

            A droga é que não posso sentir o que sinto
            preso ás amarras das convenções mundanas
            vítima e  farol das paixões humanas
            estilhaçado eu sou meu labirinto.

            Paciente ergo o meu cadafalso
            ante uma platéia indiferente
            à sombra de um deus onipresente
            rivais a esperar um passo em falso.

           Na curva destes dias conturbados
           olho ao redor e sinto o silêncio
           dias passados em melancolia.

           Atroz herança de um futuro imenso
           mas habitante da tenda do passado,
           o resto é fenecer numa moldura fria.



( O medo, a ignorância e a inércia que grassavam ao redor eram-lhe estímulos e ele avançava entre os escombros fumegantes da retidão e da decência. )



Oz
Uma madrugada de angústia de 2012.  
                                                                                                                                                                                                            

Um dia quase feliz

          Ontem eu conheci uma pessoa...
          Alguém que, com maestria rara e mão firme faz dos invisíveis fios cotidianos no quadro da memória / esquecimento a bem urdida tecitura do mundo.
          Nos textos que li senti a presença de alguém com um olhar vivaz,  afetuoso e cáustico ( ao mesmo tempo ), alguém de mente insone e espírito inquieto e lúcido.


          Tânger já não há...

          O retorno se mostra impossível e estamos perdidos numa nau de horror e caos.
          Se antes a luz lunar e um pouco de conhaque nos deixavam comovidos como o diabo agora nos envolvemos no manto áspero da desilusão e da indiferença.

          Sentir é saborear.

          Talvez tenhamos, cada um de nós,  um pouco de Sísifo, talvez mais do que possamos imaginar. Quem sabe a cada dia, a cada hora, a cada momento a pedra que pensamos ter depositado no cume da montanha não seja, de fato, o bote no qual procuramos nos equilibrar neste caudaloso Estige cotidiano, Carontes sem óbulos nem remos...





Oz
Junho de 2011

terça-feira, 31 de julho de 2012

passagens de Charlie Wild




Ele entregara  uma faca a ela dizendo: Toma, só você pode me ferir.
Ele a amava.

Então o senhor  Tempo interveio  e as luzes do caminho tornaram-se fôscas e os seus passos se tornaram trôpegos e o que eram então corcéis velozes se metamorfosearam em pássaros molhados...

Você está com medo Charlie Wild, medo que descubram seu esconderijo de dor.

Teu réquiem foi escrito há anos mas os teus passos te levaram além da maldição da tua estirpe.


Oh, Charlie, que armadilha fizeram pra você!!!

Á sombra, ressonam teus mais próximos fantasmas á espera da tua anunciada ressurreição.

Em algum lugar desta sala tôsca um quadro de absoluta desolação...

(...)

quarta-feira, 18 de abril de 2012

Charlie Wild




Difícil saber que espécie de sentimento aquele que, de um modo um tanto persistente, empurra aquele

jovem rumo a uma clausura incomum.

Furtivamente ele relanceia os grandes olhos negros aos que passam ao seu redor.

Os simoníacos ofereciam, por uma ninharia, as chaves da sala das luzes.

À mesa do jantar foi- lhe servido as vísceras de uma hiena e coube-lhe sorver uma taça com o vinho

tinto da safra da desesperança.

No meio da noite teu testamento foi adulterado á luz de uma candeia de aço.

(...)

E quando tudo o mais parecia perdido para sempre na bruma dos séculos eis que surge à porta a

figura austera do pai.

Eis que o tempo parece congelar no limiar daquela visão entorpecente.


Oz
18.04.2012

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

Entre as colunas do corpo-templo





Enquanto o tempo jorrava, inexorável, ele permanecia andando às cegas, absôrto no seu templo outrora sagrado onde as luzes se apagavam uma a uma.
A cidade há muito fechara as suas portas ao mensageiro que veio de longe, de um tempo onde havia pastores e no deserto havia silêncio, luz e paz.

Élis, seus chamados se perdem no vácuo.
Nas tabernas iluminadas o riso sarcástico de apresentadores sádicos.
Nos palcos iluminados o miasmático aroma de ilusões efêmeras.

Oh, tempo de tenros frutos cadavéricos.
Oh, tempo de sombras abissais.

Ele não reflete mas o seu templo outrora sagrado agora é um mero cabide de penduricalhos e fonte doentia de experiências funestas.

Megalômanos anões hodiernos numa busca infrutífera.

Quando veio a tempestade ácida e os cabelos das mulheres deslizavam pelos bueiros da cidade ensandecida era possível sentir a corrosão em cada abraço e ouvir à distância o ladrar de cães perdidos.

O templo outrora sagrado era agora um antro onde vicejavam a angústia, o ódio e a impotencia...


Oz
27. 02. 2012

" Todas as coisas são lícitas mas nem todas convêm; todas são lícitas mas nem todas edificam. "
Co. 10;23

sábado, 11 de fevereiro de 2012

letra para uma im-possível canção do Renato





Que pode significar esta canção perdida
como cicatrizar esta ferida
na minha rude face.

Como estancar este desejo
o corpo a fenecer, o olhar lampejos
garoto sem amanhãs, mesmo que eu queira.

O que pode significar independência
como interromper esta demência
que em nosso meio nasce
Que pode significar esta canção dorida
menino que então fui numa outra vida
que já não há...

Este corcel a cavalgar rumo ao devir
um barco ao léu
tamanho amar, tamanha dor, nenhum porvir
sonhos de céu...

Ao menos uma vez banhar no Tejo
um corpo frágil em estilhaços
e receber mais um abraço sem vislumbrar
nenhum cortejo.

Um garoto que partiu da casa paterna lendo a canção do carrasco
no olhar sonhos de fortuna e glória
adormeceu e despertou no cadafalso.

Um garoto que entrou pela noite insone e belo
um pequeno Davi, um Da Vinci, Tolstói, Grande Otelo
suaves canções permanecem onde andaram os seus passos.

(... também os vestígios das asas carbonizadas dos seus sonhos ).


Oz
09.02.2012

terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

flores loucas




De repente, te tornastes um caçador de vagalumes numa longa noite prenhe de ruídos fantasmais.
Teus pés te conduzem a estranhos caminhos.
Adentras, autômato, tabernas incendiadas e casamatas em ruínas.
Estás condenado a solidão de eras abissais.

Mas você resiste!

Num beco próximo um bluesman sussura:

O troço é tão estranho
a vida é um tal marasmo
quando não somos ermos
somos asnos.
O troço é tão estranho
a vida é um treco louco
ou somos multidão
ou somos poucos.
O troço é tão estranho
eu nunca saco nada
me sinto um severino
na embaixada.

De repente, como disse aquele cara do Los Angeles Times, tu percebes que há um morcego vivo preso por um barbante na tua árvore de natal...

De repente..
No estio teu coração germina
e surgem flores loucas na tua face
tua lembrança é o teu baluarte
teu sentir é um mosaico rupestre...

Oz
07.02.2012